O ronco do trator do pai, Antônio, e os passos incansáveis da mãe, Ivone – que dirigia caminhão, ajudava na lavoura e ainda preparava refeições para os funcionários – fazem parte da melodia que embala as lembranças da infância de Mari Neide Ausani, na pequena Santo Augusto. Lá, em meio à terra vermelha, ela e seus dois irmãos viviam a liberdade de andar de bicicleta com bonecas na garupa, construir casas de lata no quintal e “cozinhar” bolos de chocolate feitos de barro. Foi nessa simplicidade que o sonho de ser médica começou a tomar forma.
– Era como sonhar com o impossível, mas crianças não sabem disso. Eu olhava o doutor Juarez Andriguetto, nosso clínico geral e pai de uma amiga com quem sempre brincava, e pensava: “Eu quero ser assim”. Ele fazia tudo, desde consultas até pequenas cirurgias, e tinha algo mágico na forma como cuidava das pessoas. Era muito humano – relembra Mari, hoje com 54 anos, ginecologista funcional e regenerativa, especialista em cirurgias íntimas e em saúde da mulher. Até mesmo as brincadeiras de criança já revelavam sua inclinação para a Medicina:
– A gente brincava de hospital. Uma vez, transformamos um carrinho de mercado abandonado em uma maca. Era só brincadeira, mas isso foi fortalecendo o sonho – recorda.
A escolha pela ginecologia, no entanto, não foi imediata. Ao ingressar no curso de Medicina na Universidade Federal de Santa Maria, Mari tinha certeza de que seria pediatra. – Na pediatria, eu sofria com a dor das crianças. Foi insuportável. Naquele mesmo período, comecei a ajudar colegas em partos e cesáreas no hospital universitário, e algo se acendeu dentro de mim – conta.
O estalo definitivo veio durante um intercâmbio em Londres, quando uma amiga fez a pergunta inevitável: “Por que você não segue na área de ginecologia?” – Voltei para o Brasil, fiz a prova para monitoria em ginecologia e tirei o primeiro lugar – orgulha-se. A dedicação logo se transformou em paixão pela obstetrícia, e Mari se tornou referência no cuidado integral à mulher.
''Minha mãe é minha inspiração de força. Mesmo agora, aos 74 anos, lidando com a demência, ela segue me lembrando da importância de lutar pelo que importa. E a doença dela reforça como precisamos buscar caminhos para que as mulheres evitem problemas semelhantes.''
EM BUSCA DE SUA MELHOR VERSÃO
Após a residência, Mari trabalhou em São Gabriel, onde acumulou experiências intensas nos plantões do SUS e na clínica privada.
– Foram anos aprendendo a lidar com a vida e a morte, o que moldou minha forma de enxergar a Medicina: sempre com empatia. Meu trabalho não é apenas técnico, é sobre criar vínculo – ressalta. As experiências que moldaram sua trajetória também vieram das perdas pessoais que enfrentou. – Os dois abortos espontâneos que tive foram desafios que me aproximaram ainda mais das mulheres que me procuram. Passei a entender melhor a angústia, a dor silenciosa e as incertezas que elas enfrentam – compartilha.
Determinada a voltar para Santa Maria, Mari passou em um concurso temporário na UFSM. Depois, optou por seguir na clínica Fertilitá, onde atuou por mais de uma década, consolidando-se como referência no atendimento a mulheres e casais em busca do sonho da maternidade. Com uma abordagem humanizada e foco em reprodução assistida, Mari dedicou-se a procedimentos de fertilização e inseminação artificial, oferecendo suporte integral em todas as etapas do tratamento. Sua experiência na Fertilitá a preparou para fundar sua própria empresa, a Clínica Donna, onde oferece atendimento de excelência focado na saúde feminina em todas as fases da vida.
A jornada na reprodução assistida, com suas alegrias e desafios, tornou-se uma missão pessoal. A cada casal que chega ao seu consultório, Mari busca conhecer profundamente suas angústias e desejos, oferecendo tratamentos modernos, acolhimento e empatia. Ela entende as dificuldades das tentativas frustradas e o vazio de um beta negativo, mas também conhece a alegria imensa de um sonho realizado. Quando o tão esperado “positivo” chega, Mari compartilha a emoção e a gratidão, sentindo-se parte de algo profundamente transformador.
NO CENTRO DE TUDO, A FAMÍLIA
No coração da família que Mari construiu com o marido, Flávio Maron, com quem está casada há 35 anos, está Henrique, o único filho. Aos 24 anos, formado em Administração e morando em Portugal, ele carrega nos olhos o que a mãe chama de “o brilho das possibilidades do futuro”. – Ele é a minha maior paixão e a inspiração para seguir crescendo – afirma.
Mari e Flávio se conheceram ainda em Santo Augusto. Ele foi um grande parceiro durante a residência médica da ginecologista e em todas as mudanças de cidade e carreira. Hoje, é dono de uma revenda de carros e o apoio firme na construção do lar acolhedor que compartilham. – O Flávio me entende como ninguém. Ele é o alicerce que me permite voar e voltar para casa com a certeza de que sou amada e compreendida – emociona-se.
Nessa trama de relações familiares, a médica encontra as raízes que a mantêm forte, a memória que a impulsiona e os laços que a fazem acreditar na importância de cuidar, acolher e transformar vidas.
A UNIÃO ENTRE EMPATIA E TECNOLOGIA AVANÇADA
Mari é uma parceira na jornada de cada mulher. Especialista em reprodução assistida, ginecologia funcional e cuidados para mulheres em todas as fases da vida, sua missão vai além da técnica. Ela acolhe, orienta e transforma, acompanhando desde a primeira consulta na adolescência até os desafios da menopausa. Com empatia e tecnologia avançada, ajuda casais a realizarem o sonho da maternidade enquanto oferece suporte integral à saúde feminina, promovendo a prevenção, a longevidade e o bem-estar pleno.
Hoje, ela carrega histórias de pacientes de diferentes momentos da vida: mulheres que ajudou a dar à luz, as que buscaram apoio na menopausa e aquelas que recuperaram a autoestima com cirurgias íntimas. – Tenho pacientes que viajam horas para se consultar comigo porque sentem que aqui há acolhimento, há escuta. A ginecologia vai além do exame físico. É um espaço de diálogo, em que as mulheres podem se abrir sobre inseguranças, dores e medos – comenta.
Nos últimos anos, Mari dedicou-se a estudar ginecologia funcional e regenerativa. Essa abordagem foca no bem-estar físico e emocional, oferecendo tratamentos modernos para mulheres acima dos 40 anos.
''Cinquentar foi, para mim, um marco, um período de autoconhecimento e redescoberta. Passei a entender ainda mais a importância da terapia hormonal e dos cuidados específicos para essa fase da vida. Depois que entrei na menopausa, percebi o quanto a ciência pode transformar a qualidade de vida. É possível envelhecer com saúde, energia e vitalidade.''
A Clínica Donna é uma boutique médica equipada para procedimentos modernos como laser íntimo, radiofrequência e cirurgias minimamente invasivas. Esses tratamentos não só melhoram a estética, mas também restauram a funcionalidade, promovendo autoestima.
O trabalho da médica na área de cirurgias íntimas é uma assinatura pessoal, refletindo sua dedicação e sensibilidade. Assim como a cirurgia plástica, que é uma arte em si, as intervenções realizadas na região íntima feminina exigem um olhar detalhado, preciso e respeitoso. Cada procedimento é feito com cuidado para restaurar a estética, a funcionalidade e a autoestima da paciente.
– Cada resultado é único, e o objetivo final não é apenas uma mudança externa, mas uma transformação interna. O cuidado com os detalhes, o respeito pelos limites e o foco na harmonia do corpo são nossos pilares. O mais importante é devolver à mulher a confiança e o prazer de se sentir bem consigo mesma, com um corpo que reflete sua essência e liberdade. Recebo mulheres que não mantinham relações sexuais há anos, que evitavam se olhar no espelho. Depois dos tratamentos, elas voltam transformadas, empoderadas. Mari é uma defensora incansável do autocuidado. Em seu trabalho, promove não apenas intervenções cirúrgicas, mas também uma visão integral que combina saúde hormonal, nutrição e espiritualidade. – A mulher moderna quer envelhecer com dignidade. Não é sobre rejuvenescer, mas sobre viver plenamente.
No processo de trabalho, Mari entende a importância do equilíbrio hormonal para o bem-estar geral, desde a adolescência até a menopausa. Ela se dedica a tratar descompassos hormonais que afetam o humor, a energia, a libido e a saúde óssea, utilizando abordagens personalizadas, como reposição hormonal, que pode melhorar significativamente a qualidade de vida. Com o acompanhamento adequado, é possível prevenir doenças relacionadas ao envelhecimento e promover uma vida saudável e equilibrada, sem que os hormônios sejam um obstáculo.
Mari também destaca a importância de seguir se atualizando. Atualmente, está cursando uma pós-graduação no Rio de Janeiro, focada em ginecologia regenerativa. Essa oportunidade tem ampliado seu conhecimento sobre terapias hormonais, tratamentos estéticos íntimos e abordagens holísticas para o bem-estar feminino. Expert em Ginecologia Regenerativa pela ABGREF, ela também integra entidades como a Associação Mulher Ciência e Reprodução e participa de mentorias na Hormones Mentoring do Dr André Vinicius para se manter conectada às descobertas mais recentes na área.
Ao refletir sobre sua trajetória, Mari afirma:
''Posso dizer com toda a certeza: estou na minha melhor idade. Sinto-me plena, feliz e resolvida. Não adianta termos 15, 20 ou 30 anos se não aprendemos a apreciar quem realmente somos. Hoje, gosto de mim de uma forma que só o tempo ensina. É uma fase de autoconhecimento profundo, onde aprendemos a dizer ‘não’, a nos libertar de convenções e a valorizar o que realmente importa. É uma maturidade que traz leveza e força, e isso é maravilhoso.''
Essa visão ampla e sensível da Medicina, construída ao longo de décadas de estudo e prática, faz de Mari Ausani mais do que uma médica: uma defensora da saúde e da autoestima das mulheres, inspirando cada paciente a reconhecer sua própria força. Como ela mesma resume:
– No final, não sou eu que curo. É o vínculo, a ciência e a vontade da mulher de se transformar que fazem a mágica acontecer.
Por: MARILICE DARONCO