Estamos em pleno século XXI, e é alarmante como as pessoas relutam em buscar atendimento psicoterápico e psiquiátrico. Não é raro atender pessoas que negligenciam seu sofrimento psíquico por meses ou anos, chegando a um estado de muita dor, estagnação e desesperança. A identidade, o sentimento de pertencimento e o propósito de vida se perdem. Os vínculos tornam-se precários, superficiais e, por vezes, desnecessários. Muitos relatam traumas, perdas e decepções; outros, também adoecidos, relatam que se mantiveram no ciclo acelerado de produtividade, ganho financeiro e visibilidade. Esqueceram de olhar para si mesmos, seus limites e verdadeiros desejos.
A mensagem que quero transmitir aqui é que todos enfrentamos momentos difíceis e angustiantes em algum momento da vida, e que se enxergar frágil é humano e um pedido de ajuda. Reconhecer que temos limites e que não funcionamos como máquinas é sinal de lucidez. Muitos me dizem que marcar a consulta e ter chegado ao consultório foi humilhante, que foi difícil digerir a necessidade de ajuda. Esses pacientes são os que preciso estar mais atenta, pois os vejo com um pé no consultório e outro lá fora, com grandes chances de não seguirem o tratamento no primeiro sinal de melhora. São esses que se mostram "fortes", mas que, na verdade, escondem uma dor muito maior do que a que é expressa ali. Essa "casca" de autossuficiência é a mais conhecida pelo sujeito; foi a maneira que ele desenvolveu para enfrentar os desafios da vida. É a casca que até então o protegia da dor, do nível de exigência do ego e da demanda da vida. No entanto, por ser fina e frágil, não resiste ao colapso; a mente e o corpo pedem socorro. É nesse momento que devemos acolher a fragilidade, dar colo e fortalecer o que a casca quebrada esconde: o eu verdadeiro.
Saúde mental não é a ausência de doença ou dor psíquica. É ter a capacidade e a coragem de reconhecê-la e acolhê-la. É ouvir-se internamente com carinho, buscar compartilhar a dor com alguém de confiança ou com um profissional habilitado. É ter a oportunidade de se expressar, se aliviar e enxergar que a coragem reside na nossa vulnerabilidade. Quando pedimos ajuda e falamos abertamente sobre nossos sentimentos, nos mostramos reais, inteiros, e abrimos uma porta para a compreensão de quem somos e por que estamos em sofrimento. Parar e analisar nossa dor possibilita esclarecer sua magnitude, assim como a de nossas potencialidades. Contudo, por estarmos cegos no sofrimento, é necessário contar com alguém em equilíbrio que nos direcione e nos mostre que temos capacidade de encontrar a luz e a força do ego que tanto precisamos.
Há alguns dias, atendi uma paciente que disse aos pais que não iria a um evento familiar porque ainda não estava bem; havia iniciado recentemente o tratamento para depressão moderada. Ela me contou que foi julgada como uma pessoa desinteressada pela família, sua dor foi subestimada e ninguém entrou em contato para lhe dar uma palavra de apoio. Quando soube, por meio dos pais, o que os familiares haviam dito sobre ela, ficou chateada, e relatou que se dissesse que estava com febre, teriam dado mais importância. Fico pensando que, assim como ela, há muitas pessoas que se encontram em depressão, sem condições de buscar tratamento, isoladas, muitas em sofrimento talvez maior do que o da minha paciente, sem apoio algum e sem conseguir trabalhar, correndo o risco de se perder nessa dor que sozinhas não conseguem parar. É importante que as pessoas saibam que a depressão, muitas vezes, é pior do que uma doença física. A dor psíquica pode ser incapacitante; em casos mais graves, é como se você estivesse sem vida, mas existindo em um corpo. Há perda de esperança e propósitos, os sentimentos são negativos, e nada faz você reagir. Há um desequilíbrio de neurotransmissores que apenas antidepressivos podem ajudar a corrigir.
Diante dessa realidade que compartilho, convido você a estender a mão para si mesmo nos momentos difíceis; não reprima suas angústias. Não siga colando a sua casca para dizer que está tudo bem. Se ela quebrou, é porque algo precisa sair de dentro dela, algo está clamando por espaço para ser expresso e compreendido. E se você estiver bem, com a saúde mental em equilíbrio, estenda a mão a quem precisa, a quem busca ajuda; oriente que a consulta com um psicólogo ou psiquiatra pode ser útil. Vamos tornar essa ação uma responsabilidade compartilhada, em prol da redução do sofrimento psíquico, dos transtornos mentais e do suicídio, em prol da vida, do cuidado e de uma sociedade que se cuida, que se ama e que se escuta.