Aula prática da Faculdade de Medicina de Santa Maria – 1955


Em 1954, um tema dominava os jornais do Estado: o grande número de alunos excedentes da Faculdade de Medicina da Universidade do Rio Grande do Sul, hoje Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Como problemas grandes combinam bem com ideias ousadas, naquela época, José Mariano da Rocha Filho obteve a autorização para o funcionamento do curso de Medicina em Santa Maria, anexo à Faculdade de Farmácia existente na cidade e da qual era diretor. Isso não apenas representava a realização de um grande sonho daquele que mais tarde se tornaria reitor da Universidade Federal de Santa Maria, mas também o surgimento do primeiro curso de Medicina do interior do Brasil e o embrião para que a cidade se tornasse o grande polo de saúde que é hoje.

Os 70 anos do Curso de Medicina da UFSM foram amplamente comemorados ao longo deste ano, especialmente em agosto, quando um baile reuniu diferentes gerações do curso e foi lançado um documentário do Centro de Ciências da Saúde sobre essa data tão especial. Motivos para festejar não faltam: são mais de 700 alunos matriculados atualmente e mais de seis mil alunos formados, distribuídos em 120 turmas, nessas sete décadas.

Maquete da Faculdade de Medicina e Farmácia de Santa Maria – 1958

 
Já se passaram mais de 50 anos desde que o patologista e professor Carlos Renato Almeida Melo, 76 anos, se formou em Medicina pela UFSM.
– Entre as minhas melhores memórias do curso estão os professores que conheci e que deixaram uma marca em mim, além dos meus colegas de turma e das turmas próximas. Depois, como professor, convivi com centenas de alunos, todos hoje profissionais reconhecidos em suas áreas, com muitos dos quais convivo e trabalho ainda hoje – afirma Melo.

Um dos grandes destaques do curso de Medicina da instituição é a existência do Hospital Universitário e como a atuação nele auxilia no aprendizado prático dos estudantes. Mas nem sempre foi assim.
– Quando eu era estudante, não tínhamos hospital escola e usávamos as dependências do Hospital de Caridade, que na época eram muito precárias: para atividades de ensino. Nas disciplinas chamadas básicas, não tínhamos quase nenhum instrumento didático. As dificuldades foram sendo superadas lentamente. Não apenas como ex-aluno e ex-professor, mas como pessoa, tenho muita satisfação em ver o desenvolvimento que temos hoje em relação aos primórdios do curso. Os professores são bem preparados e os alunos são muito bons. Como paciente, tenho consultado vários ex-alunos e vejo o quanto eles são dedicados – comemora.

A anestesiologista Miriam Seligman Menezes, 71 anos, além de formada em Medicina pela UFSM em 1977, tem uma história familiar que une gerações como docentes do curso.
– O tempo de faculdade, em um curso sonhado e batalhado, numa época de quase adolescência, pois entrei com 18 anos, foi mágico e desafiante. Amizades novas, experiências novas, enfrentamento das mazelas da vida (doença, pobreza, morte), estudos em grupo, festas. Todas essas situações foram construindo quem eu sou. Meu pai, Salomão Seligman, foi fundador da disciplina de Urologia da UFSM, chefe do Departamento de Cirurgia por muitos anos e diretor do Centro de Ciências da Saúde, do qual eu pertenci. Dediquei mais de 35 anos ao ensino médico e à pós-graduação, formando um número enorme de médicos e médicos residentes em anestesiologia. O HUSM foi minha casa por longos anos e tenho-o sempre no meu coração – afirma.


O oftalmologista Álvaro Garcia Rossi, 62 anos, formado pela turma de 1985, se tornou professor do curso de Medicina há 32 anos.
– Meu pai também era médico e foi professor da UFSM. Segui seus passos na minha vida. Fiz vários amigos por todo o Brasil e inclusive no exterior, graças a ser professor da UFSM. Ser professor do curso neste momento em que ele completa 70 anos representa a coroação de todo um trabalho. Saber que já passaram mais de três mil alunos por mim, agora espalhados por este Brasil, é muito gratificante. O que mais me orgulha é ver nossos ex-alunos brilhando por este país – comemora.

Mas não é só nas gerações mais antigas que o curso de Medicina deixa sua marca. Rafael Vaz Machry, 36 anos, formado em 2010 na instituição, atua como docente desde 2016 e como coordenador do curso desde 2022.
– Um dos grandes diferenciais do curso é a história que ele tem. Recebemos alunos do país inteiro e estamos classificados no ranking de qualidade de cursos como o nono melhor do Brasil. Temos alunos formados aqui pelo mundo inteiro e contamos com professores que realmente vivem a medicina e ensinam aos seus alunos aquilo que praticam todos os dias. Isso sem contar o papel do Hospital Universitário, que abre suas portas para que os alunos tenham contato com um número gigantesco de pacientes e casos, permitindo o desenvolvimento das habilidades clínicas – afirma, entusiasmado, o coordenador.

Alunos do 1º ano de Medicina em viagem para um curso em São Paulo, acompanhado do Reitor José Mariano da Rocha Filho – 1959

Machry carrega consigo um legado que vai além dos diplomas pendurados nas paredes da instituição onde se formou. Como alguém que cresceu ouvindo histórias de seus pais, ambos médicos formados em 1984 no mesmo curso, sua conexão com a Medicina representa uma ponte entre gerações, unindo o respeito pela tradição com a urgência de adaptar-se às mudanças incessantes da área. Machry não apenas ensina, mas vivencia diariamente a evolução do ensino médico, mantendo um diálogo constante com os professores que o formaram, agora seus colegas, e com os alunos que buscam, em cada aula, compreender o futuro da área.
– A medicina vem evoluindo e os desafios são constantes. Enfrentamos várias situações de saúde, como a pandemia da Covid-19, e agora a situação das enchentes, e isso fez com que nos reinventássemos. A medicina evolui muito rápido, a velocidade do conhecimento cresceu e a complexidade também. Há novas tecnologias, novas doenças, e precisamos estar preparados para isso – argumenta.

Os setenta anos do Curso de Medicina da UFSM são marcados por uma trajetória construída por histórias de dedicação e inovação, refletindo o compromisso de várias gerações para que ele mantenha o alto padrão com o qual ficou conhecido em todo o país. O curso não é apenas um espaço de ensino, mas um lugar onde vidas se cruzam, onde o conhecimento é transmitido e ampliado, e onde o futuro da medicina é continuamente reinventado. A celebração desses setenta anos não é apenas uma homenagem ao passado, mas um lembrete do papel importantíssimo que o curso tem para os rumos da saúde de todo o Brasil.