Em aulas, palestras, mesas de restaurante ou churrascos em família, o assunto sobre o software com inteligência artificial que interage com humanos, criando soluções em textos para diferentes questionamentos, é recorrente. Pudera: é encantador e assustador imaginar que um robô tem capacidade para escrever algo semelhante a este texto, que levo cerca de duas horas para finalizar, sem erro gramatical algum – traços da fragilidade humana – e em uma fração deste tempo. A pergunta dentro da pergunta que abre esta crônica é: “você tem medo de ser substituído(a)?”. Creio que todos temos. O ser humano é movido pelo instinto de sobrevivência, que nos provoca a focar no estudo, a trabalhar bem e melhor, a colocar uma roupa bonita a fim de atrair companhia, que não encontra limites e parte para um novo canudo, uma vaga mais competitiva na empresa ou outro relacionamento. É o medo combinado à coragem que nos mantém pulsando. Mas não, não consigo conceber que há espaço para que a escrita criativa seja substituída por um compilado de dados aleatórios. Escrever é complexo e tem, no seu eixo, uma dose exagerada de sensibilidade. O bom texto é o resultado de uma escolha criteriosa, quase metódica, de palavras e situações verbais, somada às histórias reais – que podem ser embaladas para ficção – de quem redige. Valter Hugo Mãe, um dos maiores escritores da atualidade, considera-se um colecionador de palavras. Quando ele abre o seu baú pessoal de vocábulos, creio que há uma conexão corrente entre cérebro, coração e mãos, que consagra sua identidade poética. Aliás, basta virar quatro ou cinco páginas de qualquer livro do próprio Valter, de Mia Couto ou de Carla Madeira, por exemplo, para compreender que, para escrever, há de estar vivo. A meu ver, é tão óbvio, que questiono: que estilo de literatura se consome por aí para confiar que a escrita artificial vai sobrevir a afetiva? Para quem me rotula como ingênua, complemento meu pensamento. Estou no time que julga a tecnologia como aliada. É uma facilitadora, aproxima, encurta caminhos e apresenta soluções práticas para o dia a dia. Assim é também com o ChatGPT, ao criarmos uma legenda rápida, revisarmos um parágrafo ou otimizarmos todo e qualquer processo que envolva uma escrita burocrática de rotina. Conheço e aplaudo quem já produz maravilhas com a ferramenta. Mas, fora o deslumbramento com o desconhecido, observo racionalmente o conceito de mundo em que estamos inseridos e compreendo que, há algum tempo, as buscas mais profundas têm sido fundamentadas naquilo que nos forma humanos. Percebo a preocupação com conexões reais, a valorização do artesanal, do imperfeito, do natural, assim como o cuidado com o detalhe, que singulariza um sujeito em meio à multidão. Sendo assim, hipervalorizar uma experiência artificial a ponto de engavetar elementos emocionais e reduzir o ser humano à sua utilidade, sendo digno de rápida substituição, parece incoerente. Na verdade, beira o cafona